Diante do cenário mundial, e da paralisação de diversas atividades, além da preocupação com desemprego e falência de muitas empresas, o momento pede cautela e habilidade dos fornecedores de produtos e serviços para manterem suas relações com seus consumidores.
Pensando nisso, seguem abaixo esclarecimentos e orientações relacionadas à legislação e ao momento vivenciado:
A regra de ouro é: negocie!
O momento pede sensatez e comunicação para manter as relações com os consumidores de produtos ou serviços. O ideal é que as partes (consumidor e fornecedor) busquem uma solução que evite o cancelamento dos contratos.
A suspensão temporária do serviço, ou do fornecimento de produtos, em razão da situação atual, é indispensável para continuidade das atividades econômicas e das relações com os consumidores.
Para evitar o desfazimento dos negócios, é imprescindível que haja flexibilidade no momento.
Caso haja o cancelamento do contrato, orienta-se que não haja qualquer cobrança de multas, tendo em vista que tal cobrança pode ser considerada como prática abusiva pelo fornecedor, em razão das circunstâncias especiais relativas ao COVID-19.
Outro ponto que deve ser observado é o dever de atuação de boa fé das partes, ao agirem com lealdade e boa fé. O artigo 4º do Código de Defesa do Consumidor prevê a necessidade de transparência e boa fé nas relações de consumo. Enquanto o artigo 422 do Código Civil estabelece a necessidade de que os contratos sejam guardados pelos princípios da probidade e boa fé.
Aditamento de contratos, como funciona?
O artigo 480 do Código Civil dispõe sobre a possibilidade de aditamento dos contratos, com novas regras, especialmente para cumprimento das obrigações, para pleitear que ela seja reduzida ou alterada.
Por tais circunstâncias, é importante que o consumidor que esteja sofrendo os efeitos desta crise, conheça previamente quais são seus direitos, e, sobretudo, quais os instrumentos jurídicos que poderão auxiliá-lo.
Assim, veja agora os principais pontos que selecionamos para ajudar e fortalecer as suas decisões tanto para o consumidor quanto para o empresário que é o fornecedor do produto ou serviço.
O que é caso fortuito ou força maior, e o que isso tem a ver com o meu negócio nesse momento?
O artigo 393 do Código Civil estabelece a seguinte regra o devedor não responde pelos prejuízos resultantes de caso fortuito ou força maior, se expressamente por eles não se houver responsabilizado. E complementa em seu parágrafo único que o caso fortuito ou de força maior, verifica-se no fato necessário, cujos efeitos não era possível evitar ou impedir.
Basicamente, dispõe sobre a exclusão de responsabilidade do devedor (ou consumidor, no caso das relações de consumo) de cumprir suas obrigações contratuais em situações extraordinárias.
Apesar da previsão do artigo mencionado acima, não existe uma listagem específica do que é considerado como caso fortuito ou força maior pela legislação brasileira.
Via de regra, essas situações de excepcionalidade são previstas no contrato firmado entre as partes, o que determina que a análise seja feita caso a caso.
O que é onerosidade excessiva, e o que isso tem a ver com o meu negócio nesse momento?
O artigo 478 do Código Civil estabelece que nos casos de prestação continuada ou diferida, se a prestação de uma das partes se tornar excessivamente onerosa, com vantagem extrema para a outra, em virtude de acontecimentos extraordinários e imprevisíveis, poderá o devedor pedir a resolução do contrato.
Cláusulas com o conteúdo do artigo acima, frequentemente são previstas em contratos de fornecimento de produtos/serviços de forma continuada.
Esse tipo de previsão se aplica àqueles casos em que o contrato se torna extremamente oneroso para uma das partes, enquanto a outra parte possui vantagens extremas, o que reflete um desequilíbrio na relação entre as partes.
Ao analisar os possíveis efeitos em relação à pandemia, será possível que alguns contratos tenham como motivo de resolução a regra contida no artigo 478 do Código Civil.
O que é teoria da imprevisão, e o que isso tem a ver com o meu negócio nesse momento?
Os contratos são regidos pelo Código Civil, sendo que as partes têm liberdade para estabelecerem as cláusulas contratuais, com intervenção estatal mínima.
Todavia, importante destacar o disposto pelo artigo 421 do Código Civil, em seu parágrafo único, que dispõe sobre a excepcionalidade das revisões contratuais.
Nessa mesma linha discorre o artigo 421-A, III do Código Civil que expõe sobre a revisão contratual de forma excepcional e limitada.
O artigo 479 do Código Civil estabelece que a resolução dos contratos pode ser evitada através de uma modificação equitativa do contrato, especialmente nas situações em que a prestação se torna excessiva a uma das partes.
A pandemia vivenciada no presente momento se enquadra como uma situação excepcional que permite a revisão de contratos, o que dá ensejo à aplicação da teoria da imprevisão para aplicação do princípio da segurança jurídica.
E os contratos em que a minha empresa é consumidora?
De acordo com o artigo 6º do Código de Defesa do Consumidor, pessoas jurídicas também se enquadram como consumidoras de produtos e serviços. Enquadram-se nessa hipótese quando os produtos adquiridos, ou serviços contratados se relacionam com a atividade meio da empresa, e não atividade fim.
Permanece a orientação de negociar, especialmente para suspender o contrato, caso haja interrupção no fornecimento de produtos ou serviços.
E se a minha empresa tiver um contrato com instituição bancária que seja afetado por essa crise, o que posso fazer?
Nos casos em que as empresas têm um contrato firmado com instituição financeira, como por exemplo um contrato de empréstimo bancário, esse contrato será considerado como relação de consumo.
Assim, serão aplicadas as regras previstas pelo Código de Defesa do Consumidor, bem como as regras explicadas nos tópicos acima.
A orientação de um profissional da área do direito é indispensável diante de um cenário crise, especialmente para revisão de contratos. Nesse sentido, caso surjam dúvidas, ou necessidade de auxílio para revisão de contratos, o ideal é procurar um um advogado especialista.
Letícia Beltrami de Campos
OAB/PR 76.446